segunda-feira, 30 de julho de 2012

Indiferença...

"E nunca me senti tão profundo e ao mesmo tempo tão alheio de mim e tão presente no mundo"....
Albert Camus

 

          Certamente um dos filmes sobre educação mais impactantes que já vi. Não apresenta o professor como sendo o glorioso redentor do futuro dos seus alunos, o que vai deixar tudo bem com métodos inovadores e chegar até a alma de seus alunos. Nesse caso, o filme Indiferença – Detachment (2012) foi muito mais profundo, conseguiu mostrar a máquina perversa que é o sistema educacional e como aniquila o ser humano em suas engrenagens envenenadas de teorismo, indiferença, prioridades erradas e políticas desastrosas que visam números ao ser humano.
            Já no início as declarações de professores sobre como encaram a profissão é um indicativo que nada há de glorioso ser o alicerce da sociedade, como pintam muitos. Sim, somos essenciais no momento que tentamos repassar o conhecimento de mundo para que os jovens possam entender a si mesmos e sua função nessa sociedade, como um personagem mais ativo. Infelizmente, no final das contas, vale a máxima: “Nenhuma boa ação passa impune.”, e o professor passa de caminho, de guia do conhecimento, para o culpado imediato de toda a situação descontrolada na sociedade.
            O peso da angústia, do medo, da incapacidade, da frustração, da impotência diante das situações bizarras do dia a dia tanto dentro como fora da sala de aula é refletido em cada personagem que se vê preso num labirinto de impossibilidades. São alunos desinteressados, agressivos, com sérios distúrbios comportamentais, emocionais, indiferentes diante de uma vida que se estampa cinza...negra até. Pais ausentes, abusivos, ignorantes que, na própria incapacidade de lidar com as situações, transferem para a escola a responsabilidade de cuidar do seu filho como se ela fosse um substituto para a função da família. Como na reunião de pais na escola e nenhum deles aparece...não ligam, não se importam.
            Entre as cenas comuns que acontecem em qualquer escola pública, a veracidade da fala do professor substituto Henry Barthes (Adrien Brody), em forma de pequenos depoimentos, tornam a reflexão mais forte. Ser professor é viver no limite, acordar todos os dias para a batalha que se estende entre o gerenciamento do temperamento de jovens, a burocracia que anula a autoridade da instituição exigindo elevação da porcentagem de aprovação e os dramas pessoais que não podem ser esquecidos, embora negligenciados em prol de uma encenação de força e coragem! Na fala da conselheira fica claro que lutamos sozinhos por todos os outros. Ela tenta conversar com uma aluna sobre futuro, sobre a importância de rever as prioridades e diante do descaso da jovem, a conselheira desmorona e afirma, “É tão fácil não ligar, mas é preciso coragem e caráter para se importar”. E realmente é o que ocorre. É realmente fácil não ligar, não se envolver, deixar para lá, afinal, não é meu problema se os pais, o governo e a sociedade não querem que as coisas mudem...mas não é uma opção para a maioria – graças a Deus – deixar de cumprir sua função, não por idealismo cego, mas porque é o seu trabalho, é o que precisa ser feito e como ninguém mais fará, pelo menos minha parte tem de ser feita.
            O filme vai além da sala de aula e dos conflitos entre docentes e discentes. Explora as questões relacionadas à gestão e como a máquina desmorona diante de ações mal intencionadas vinda do governo, de secretarias que nada entendem de educar, apenas de números vazios de contexto. Passa pelo convívio familiar caótico que produz jovens agressivos, sem limites e prontos a explodir a qualquer momento. E é preciso analisar como muitos pais conduzem seus filhos numa via contrária ao que propõem a escola. Educar, instruir, dar exemplos de bom comportamento, ética e cidadania...mas muitos pais colocam a escola como inimiga...Muitos alunos problemáticos podem ser melhor compreendidos após conhecermos os seus pais, como a jovem com problemas de peso, negligenciada pelo pai – absurdamente – e sofrendo bullying dos colegas, o seu desfecho, trágico, mostra-nos a fragilidade de nossos jovens, tão perdidos em situações limites tanto em casa quanto na vida.
            Realmente é um mosaico realista e em alguns momentos depressivo do ato de ensinar. E vale repensar as posições atuais, não deixar que o desespero tome conta, mesmo que a situação nos revele uma total falta de solução. As cenas finais em que Henry dá uma aula sobre o conto de Edgar Allan Poe “ A queda da casa de Usher”, parece ter um teor metafórico ácido, um prognóstico do que a educação tem se tornado...a destruição dos princípios que norteiam a função da escola, mostrando que o caos se instala e os muros são erguidos sem chance de serem transpostos...a sala vazia e perdida. Sem alunos, folhas ao vento, palavras solitárias em uma profissão desgastante e desgastada...como soldados prestes a perder a guerra, seguem sem perspectiva os últimos remanescentes...

By Léiah V. Laverny

3 comentários:

  1. Maravilhoso, lindo e certamente uma obra de arte!

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  2. Acabei de assistir ao filme, muito realista. A frase de Camus no incio, retrata bem o mundo interior do professor no filme.

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  3. Acabei de assistir ao filme por alguma coincidência, estou num mesclado de tédio com carência que faz medo e o filme me transportou a pensamentos inúmeros sobre oque estamos fazendo aqui neste mundo . Sou de Brasilia e estou em São Paulo a trabalho e já vim meio pra baixo e esse concreto todo me fez piorar. Desculpe esta escrevendo coisas sobre mim aqui onde deveria constar oque achei dessa obra de arte, que filme maravilhoso. Então voltando, comecei a clicar e clicar pelo seu blog e estou apaixonado por suas poesias e contos de uma vida real que me identifiquei que chorei lendo algumas coisas. E queria pedir um favor se não fosse muito incomodo, queria conversar com vc diretamente te conhecer sei la. Não sei sua idade nem onde mora nem se é casada ou não nem nada mais te peço de coração que entre em contato comigo eu me vi em vc. SKYPE= japaspeed1986 EMAIL= japaspeed@gmail.com WHATSAPP= 6184681934. Me desculpe a intromissão e a indelicadeza mais meu coração pediu isso. Agradeço desde já. E obrigado por compartilhar conosco esses textos. bye A sim me chamo Wesley

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